BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Embora afirme que seu “objetivo número 1” no Ministério da Saúde será acelerar a vacinação contra a Covid-19, o novo titular da pasta, Marcelo Queiroga, admite que o cenário de oferta de doses ainda tende a enfrentar dificuldades até o segundo semestre.

“A partir do segundo semestre conseguiremos ter mais doses disponíveis. O maior país a vacinar sua população é os Estados Unidos. Depois que conseguirem vacinar a população deles, vamos ter mais doses, é a nossa expectativa.”

Em entrevista à Folha em seu gabinete neste sábado (10), ele atribui o problema a uma carência mundial por vacinas e diz que o Brasil negocia doses adicionais prontas na tentativa de acelerar a campanha de imunização.

Após citar a previsão de vacinar 1 milhão de pessoas por dia, ele evita dar novas metas e diz que um dos impasses é a falta de liberação de doses pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). “Não posso chegar dando canetada na Anvisa.”

Em meio à discussão sobre a possibilidade de compra de doses pela iniciativa privada, o novo ministro diz desconfiar da capacidade do setor de obter doses: “Quero ver para crer”.

Questionado sobre discursos do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) que vão na contramão de pontos que defende, como uso de máscaras e isolamento, Queiroga nega atritos e diz que cabe a ele persuadir o chefe sobre as “melhores práticas” contra a Covid. “Se não conseguir, a falha é minha, e não do presidente.”

Folha – O país chegou a 350 mil mortes pela Covid, e é hoje o segundo país no mundo em número de casos e mortes pela doença. Como avalia a situação da epidemia hoje?

Marcelo Queiroga – O que difere o cenário do ano passado para o atual é a esperança das vacinas.

Se me perguntar qual o objetivo número 1 da minha gestão, diria: implementar uma campanha de vacinação que possa em curto espaço de tempo atingir toda a população brasileira. Para isso, precisamos otimizar a gestão do Ministério da Saúde.

O presidente já editou uma medida provisória que deve ser publicada criando uma secretaria extraordinária para o enfrentamento à pandemia da Covid, que visa tornar mais eficientes as ações.

O primeiro ponto é ter uma comunicação mais pronta com a sociedade, levando as informações sobre o cenário epidemiológico e medidas preventivas.

Folha – Nos primeiros dias da sua gestão, o país tem atingido mais de 4.000 mortes por dia, o que mostra que a situação só se agrava. O sr. tem falado em campanhas de prevenção, mas isso ainda não saiu do papel. Qual o plano a curto prazo?

Marcelo Queiroga – Não deveríamos já ter uma medida mais dura diante desse número tão alto?Esse número de mortes que ocorre hoje é reflexo do que ocorreu. O que aconteceu: campanha política, feriado de Natal, férias, Carnaval que não teve Marquês de Sapucaí, mas que as pessoas estavam todas nas suas casas fazendo festinha. É reflexo dessas ações.

Precisamos ter eficácia na comunicação para adquirir a confiança da sociedade em adotar as medidas que são necessárias para frear a circulação do vírus.

Na minha primeira manifestação à imprensa, citei a pátria de chuteiras na Copa do Mundo e falei em termos uma pátria de máscaras. E é nítido que já houve uma mudança em relação a esse ponto no governo. Considero que devia já ter esse crédito de conseguir que as pessoas tenham maior adesão no uso das máscaras. Considero que devia já ter esse crédito de conseguir que as pessoas tenham maior adesão no uso das máscaras Marcelo Queiroga ministro da Saúde * Além disso, vamos lançar a secretaria extraordinária e ter iniciativas publicitárias. O foco principal é vacina, usar as máscaras e estimular o distanciamento entre as pessoas.

Folha – O sr. diz que pretende acelerar a vacinação. Como vai garantir que isso ocorra? Logo após chegarmos a 1 milhão de doses ao dia, já não foi possível manter essa meta e algumas cidades tiveram de interromper campanhas por falta de doses.

Marcelo Queiroga – Há um problema mundial de carência de vacinas. Precisamos do IFA [insumo usado para fabricação] que vem da China e às vezes atrasa, e por isso muda o calendário. Mas o canal de negociação diplomática tem sido o melhor possível, e a negociação com a China é excelente.

É uma luta diária. Temos uma estimativa de doses a serem aplicadas que depende da produção, da indústria, das entregas, da importação de doses prontas. Já eram para ter sido entregues doses do Covax Facility, por exemplo.

Folha – Mas o Brasil não poderia ter garantido alguns acordos mais cedo para evitar essa falta de doses agora?

Marcelo Queiroga – O Brasil fez um acordo com a AstraZeneca. Essa vacina não foi a primeira a ser usada para vacinar, foi a Pfizer. Mas, em maio de 2020, ninguém falava nada da Pfizer, só da AstraZeneca.

A carência é realmente uma situação mundial, e o Brasil está empenhado em conseguir as doses necessárias.

Folha – Mas de que forma? Há possibilidade de mais acordos?

Marcelo Queiroga – Sim, há possibilidade. Mas são assuntos privados entre governos, indústrias que ainda não podemos revelar, por questões de confidencialidade.

Folha – Em quanto tempo podemos ter toda a população vacinada?

Marcelo Queiroga – O nosso objetivo é acelerar a campanha sobretudo nos próximos três meses, até para dar uma satisfação para a sociedade.

Estamos buscando com as indústrias que têm doses prontas para que seja antecipada a entrega via Covax Facility e relações bilaterais. Mas os outros países também têm essa necessidade, e por isso não é simples.

Folha – O seu antecessor, por exemplo, falava em ter metade da população vacinada até julho. O sr. mantém essa meta diante desses impasses?

Marcelo Queiroga – Temos 20 milhões de doses negociadas pelo governo com a Bharat Biotech [fabricante de vacina indiana Covaxin]. E a Anvisa não aprovou até esse momento.

Não posso chegar dando canetada na Anvisa, que é uma agência regulatória. Mas eu teria mais doses em março e abril, como estava no calendário anterior, e a Anvisa não aprovou.

Folha – Mas não aprovou porque não recebeu dados de segurança e eficácia?

Marcelo Queiroga – Sim. Mas falam: “Vocês não se antecipam [em obter doses]”. E nos antecipamos em negociar com a Bharat Biotech, mas que ainda não passou pela chancela da Anvisa.

É questão técnica. Preciso como ministro da Saúde respeitar o marco regulatório da Anvisa.
Folha – E o Ministério da Saúde não tem outros planos?

Marcelo Queiroga – Buscar doses prontas de outras indústrias, de outras já aprovadas. Mas não é simples. E não quero estabelecer metas.

Temos 37 mil salas de vacinação no Brasil. Se tivéssemos doses suficientes, conseguiríamos vacinar 2,4 milhões de brasileiros todos os dias. O Brasil já é o quinto país com mais doses distribuídas. Pode avançar mais, mas só vamos conseguir se tivermos vacina.

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